Nilma Lino Gomes destaca em seu livro, “O Movimento Negro Educador”, que qualquer conhecimento válido é sempre contextual, tanto em termos de diferença cultural quanto em termos de diferença política. Na última semana o João (participante do Big Brother Brasil) foi alvo de um comentário que muitos dizem ser racista e, outros, mimimi. Entendo que o único que pode afirmar o impacto deste comentário na sua própria história de vida é o próprio João. Será que o João levou um tempo para entender, assimilar e dividir com a Camila (sua melhor amiga no BBB, e também negra) sobre o que tinha vivenciado e sentido? Ele deveria ter falado na hora? Ah, mas desde quando tem “hora certa” para falar que você está se sentindo mal com um comentário racista?
Entendo que falar o que viveu e sentiu em um momento coletivo é, também, uma proteção; pois sempre precisamos provar o que vimos, ouvimos e sentimos. Com tanta repercussão e pressão da área de marketing, o apresentador Thiago Leifert resolveu fazer uma conversa de “homem branco para homem branco”. Quando ouvi, até levantei do sofá – a tempo de assistir a Camila chorando e sendo consolada pelas amigas… Será que dá pra entender que não se brinca com o sofrimento alheio, e nem com o corpo do outro?
O desgaste do João e da Camila quase “desenhando” sobre o nosso posicionamento político – ao não estarmos dentro de uma estética eurocêntrica – é de uma afirmação tão representativa que faz com que as pessoas comecem a compreender que vivemos em um pais racista; no qual ainda discutimos sobre a morte dos crianças e jovens negros (muitas vezes dentro de casa ou da escola, por balas que são chamadas de “perdidas” mas que são muito mais “achadas” nos corpos negros). Angela Davis cita em seu livro que em 1833 aconteceu uma convenção para a fundação da “Sociedade Antiescravagista Estadunidense”, na qual foram convidadas apenas quatro mulheres – e elas deveriam ficar apenas como “ouvintes e espectadoras”. Somos até convidadas, mas desde que não façamos nenhuma manifestação.
Quero fazer um destaque que estou sinalizando uma perspectiva de gênero binária, não tenho propriedades e nem elementos para descrever de forma mais ampla – mas será que faz sentido que o homem, negro e gay, pode ter menos voz que a mulher negra? Conseguem compreender porque o João usou o coletivo para se manifestar e, mesmo assim, precisou de um homem branco para validar o seu sentimento? Para tentar fechar o texto, mas não as percepções: até quando vamos precisar desta situação para sermos acolhidos? Não desconsidero o que apresentador falou – entendo que ele teve uma ação antirracista, não se silenciou – mas até quando a humanidade ainda precisará de um homem branco assumindo as nossas verdades como reais?
Pedagoga
Especialista em Gestão de Políticas Públicas, Inclusão e Diversidade Social
Coordenação de Equipe Multidisciplinar de Formação da Comunidade Educativa
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