Nesses dias tão estranhos de pandemia, ficou impossível não falarmos da ignorância. Ignorância no sentido mais amplo da palavra: não ter o conhecimento ou ignorar a existência de conhecimento. Este conceito é uma chave para um assunto completo que permeia – porém, transcende – questões políticas e/ou ideológicas; mas que, inegavelmente, conduzem, na situação atual, à morte de pessoas em decorrência da ignorância, literalmente.
Nas redes sociais muitos “especialistas” recomendam chás, dietas e fórmulas milagrosas que, supostamente, salvam as pessoas de serem acometidas pelo coronavírus. Em meio a tantas informações – ora benéficas, quando abalizadas cientificamente; ora maléficas, quando na contramão dos meios mais eficazes e certificados para a proteção e combate à doença e ao contágio –, não consigo imaginar se o que se vê é a ignorância no sentido de ignorar o que já se sabe a respeito da nova doença e toda devastação que ela causa; ou, se se está diante da ideia de ignorância enquanto ausência de conhecimento. Adianto que esta última hipótese acaba rechaçada, haja vista a avalanche de informações diárias – e, em sua maioria, confiáveis e cientificamente construídas – que passamos a receber. Nesse mar de informações – não todas necessariamente verdadeiras –, resta saber quem surfa e quem naufraga.
A verdade é que a pandemia nos confirmou um cenário que já havia sido denunciado há alguns anos, onde a ignorância se sobrepôs a qualquer tipo de empatia, humanidade ou ideal de sociedade justa. O individualismo ditado pelo neoliberalismo arrebatou uma quantidade significativa de pessoas e fomos, inclusive, surpreendidos por muitos dos nossos que seguiram com a onda e passaram a incorporar e reproduzir discursos de violência, racismo, xenofobia, etc. A consequência disso tudo foi a vitória, nas urnas, do atual presidente que, tendo por arma a ignorância, para além de amplificar os mais retrógrados e ignorantes discursos no campo social, também passou a disseminar, quanto ao contexto pandêmico, falsas esperanças propaladas por falsos profetas. A ignorância, enquanto negação do conhecimento, passou, então, a ser a regente da condução – desastrosa, diga-se de passagem – política do país pela difícil crise sanitária, econômica, social e moral que ora atravessamos.
Embora haja quem alerte que atravessamos por uma pandemia de ignorância, está cada vez mais evidente que o caminho observado foi o inverso: a pandemia, certamente, catalisou a evidência de nossa – enquanto sociedade – mais profunda ignorância.
Valdemir Paiva
Historiador
Mestre em História
Editor na Brazil Publishing
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