***Vol. 2, Nº 008 / 2020 - 28/01 (PRESENTE) *Sociedade Paulo Vieira

O Presente… Não Existe?

Paulo Vieira

Há um argumento famoso contra a existência do tempo que, de forma simplificada, é: se uma coisa é feita de partes que não existem, a coisa mesma não existe. Ora, o tempo é feito de três partes: passado, presente e futuro. O passado, porém, não existe mais. O futuro, por sua vez, ainda não existe. Já o presente – limite estabelecido entre passado e futuro – então, também não existiria? Logo, ao não existir passado, presente ou futuro, não existindo nenhuma das três partes do tempo… O próprio tempo não existe? Ironicamente, tal argumento é milenar, já estando presente desde Aristóteles e, provavelmente, em autores ainda anteriores a ele.

Todavia, o que há de menos convincente no argumento é a maneira como ele engana sobre o que verdadeiramente é o presente. Sim, o passado (pretérito perfeito ou mais-que-perfeito) pode não existir mais, e o futuro (perfeito ou longínquo) ainda não existe…  Mas o presente seria mesmo apenas uma delimitação, apenas o ponto que marca a passagem do tempo, ou a linha entre passado e futuro? Seja perdoada a trivialidade, mas… O presente, só é presente, porque tem presença.

Talvez seja tal trivialidade, justamente, o disfarce perfeito do mistério do tempo: a presença não seria o algo necessário para que, por meio dela, possa haver uma separação dos tempos, em passado e futuro? Digamos, então, que o “presente do indicativo” é o tempo dos tempos, a intensidade total do que é real, para trás e para frente, em pretérito e em futuro – e que, até mesmo, ao ser em espaço, preenche o mundo.

Não é a presença (em sua complexidade) o que se manifesta em toda história, se expandindo em toda a expectativa, até alcançar ao próprio limite de toda a vida? Talvez seja este o ponto e, para não pecarmos por excesso de – ainda mais! – metafísica, paramos por aqui: se temos a tentação irresistível de fazer o tempo ser real a partir do presente, que ao menos reconheçamos que o lugar onde se chega é, inescapavelmente, o lugar de onde se parte – e, o ponto final, o inicial.

Paulo Vieira

Filósofo
Doutor em Filosofia
Professor de Filosofia na Universidade Federal do Paraná
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