***VOL. 2, Nº 012 / 2021 – 24/03 (IGNORÂNCIA) *Cultura Claudia Pacheco

Cesária é parto?

Claudia Pacheco

Você provavelmente respondeu que sim ao título deste texto, porque socialmente chamamos de parto o nascimento de um bebê; mas, existe um movimento contra a cesária sem indicação, pedindo para que os procedimentos sejam nomeados de forma diferente – e que parto seja apenas o parto normal, vaginal ou natural. Qual o motivo?

No Brasil o índice de cesária é muito acima do recomendado, e a cesariana é tida como a melhor forma de parto por ser “indolor” e outras falsas “vantagens”, sem citar o risco de uma cirurgia de grande porte que não é levado em conta. Nas palavras de Mônica Cupertino: “afirmar que cesárea não é parto talvez seja uma forma de levantar uma bandeira em oposição ao sistema cesarista. As taxas de cesárea eletiva no Brasil são realmente muito altas”. Mas o que isto interfere no imaginário das mulheres que, então, “não pariram?”.

Mesmo aquelas com real indicação, que entraram em trabalho de parto e a cirurgia salvou suas vidas e do bebê? De acordo com Aniele Sousa: “eu não gosto quando dizem que cesárea não é parto. Eu fiquei mais de 20 horas em trabalho de parto na maternidade Sofia Feldman, que é referência em parto humanizado no país, mas devido a complicações terminei em uma cesárea de emergência. Ouvi de muitas mulheres que eu não tinha tido um parto, mas feito uma cirurgia. Isso foi muito doloroso. Eu me sentia a pior mulher do mundo. Desconsideraram todo o meu processo porque no final entrei na faca […]. Demorei alguns meses para me libertar dessa culpa. E acredito que mesmo aquelas mulheres que optaram pela cesária também tiveram um parto. Parimos ali nossos filhos e isso pra mim é o parto. Sou contra a indústria da cesárea, mas sou a favor da livre escolha das mulheres. De tempos em tempos as mulheres são enquadradas em determinadas caixinhas e julgadas por questões que nem sempre são fruto de suas próprias escolhas”.

Maiara Moreira complementa: “acho muito cruel falar que cesárea não é parto; porque por mais que teoricamente não influencie em nada o tipo de mãe que nasce ali, na prática a mãe sofre por isso e muito, foi um dos pontos que pesaram pro meu baby blues quase se tornar uma depressão inclusive. Sofremos pq a língua é social, não é mera questão de definição de conceitos. Claro que temos que lutar e lutamos contra a indústria da desinformação, mas e as mães que sabem dos riscos e mesmo assim optam pela cesárea? Porque pra elas é mais prático, porque não querem sentir dor, seja qual for o motivo, ainda sim retirar a dimensão do parto delas, acredito ser um desserviço”.

No Brasil, pelo menos, cesária é parto sim, porquê na nossa língua não existe outra palavra para o ritual do nascimento – e, deveria? Minha promessa é fazer uma pesquisa sobre a palavra e as suas transformações no tempo; convido psicólogas e psiquiatras a também fazerem este mesmo estudo. Temos que ser menos ignorantes sobre as dores dos outros; pois, afinal, o que estaríamos realmente mudando, ao tirar a cesária do parte brasileiro?

Claudia Pacheco

Relações Públicas
Mestre em Comunicação Social
Autora do livro infanto-juvenil “A Mamãe Sangra”
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