***VOL. 2, Nº 012 / 2021 – 24/03 (IGNORÂNCIA) *Cultura Carolina Vigna

Ludwig van Borel

Uma vez, preocupada com o futuro, eu disse para a minha terapeuta que gostaria de ser surfista e ter como angústia principal na vida se daria ou não onda no dia seguinte. Em minha defesa, isso aconteceu mais de 30 anos atrás. Ela respondeu – e eu nunca esqueci – que a praia do dia seguinte poderia ser uma questão tão desconfortável para o surfista quanto as minhas incertezas eram para mim. A maioria de nós tem uma “visão bancária” (leia Paulo Freire) de mundo e acha que quem ignora aquele pedacinho de conhecimento que dominamos é menor, vale menos, é menos complexo, é mais burro. Ignorante, afinal de contas, significa “não sabedor”, “aquele que não domina um assunto”. Ênfase em um assunto. Esquecemos que há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nosso Ego.

Não creio, portanto, que seja possível mensurar a ignorância. Muitas vezes, o que medimos é a violência e achamos que são sinônimos. O homofóbico, racista, machista etc., antes de ignorante, é pura e simplesmente agressivo e violento. O que nos causa náusea no estômago é a forma como o outro nos trata. Essa agressão precisa ser combatida com todas as forças. Não é o fato do bípede ignorar a ciência e achar que remédio para piolho é a solução de todos os males que faz com que você queira distância. É a agressividade com que o diferente é tratado.

Não podemos confundir o ignorante (aquele que ignora) com o fascista (aquele que julga que apenas a sua visão de mundo está correta). Fascismo vem de “fasci”, feixe em italiano; ou seja, aquilo que aponta em uma única direção. Se tentamos impor a nossa visão de mundo ao outro, somos tão autoritários quanto quem criticamos. A ignorância tem solução, o fascismo eu não tenho tanta certeza. A ignorância termina onde a dúvida começa. A ignorância termina onde a curiosidade começa.

Então, se aí do alto do seu refinamento cultural, você acha que alguém é ignorante por não conhecer Villa-Lobos e ouvir funk, deixa eu te contar uma coisa: o ignorante é você.

Carolina Vigna

Artista Plástica e Escritora
Doutora em Educação, Arte e História da Cultura
Professora de História da Arte no Centro Universitário de Belas Artes de São Paulo
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