Há pessoas que amam a ignorância. Sim, elas existem e não é de hoje. Platão, na Antiga Grécia, já dava pistas do fenômeno. No diálogo Fédon, o filóloso fala que aqueles que condenaram Sócrates à morte assim o fizeram por ódio à razão. A moral ateniense era tida como absoluta e o contraponto levantado pelo mestre provocou a ira, o ódio ao pensamento. Liberdade de pensamento, eis o seu crime. Odeia o pensamento crítico quem não possui a dialética do raciocínio; pois, quem a usa põe em cheque as suas certezas e descobre que o caminho do conhecimento é um eterno devir. Quem não é dado a se duvidar sente-se profundamente desconfortável quando a sua visão de mundo é posta à prova. Não suporta ver a sua certeza se revelando falsa – por isso, o ódio ao pensar, à dúvida.
É muito difícil a vida de quem quer certezas. O pensamento crítico puxa o tapete, faz com que se desconfie absolutamente de tudo, torna mais tolerante a relação com outros pontos de vista e mostra que quaisquer uns podem ser temporários. O crítico não se apega a nada de forma definitiva. Platão nos exorta a não odiarmos quem nos aponta o erro. Ao contrário, devemos acusar em nós nossas dúvidas. Ao invés de odiarmos quem nos aponta a saída da caverna, sejamos corajosos em buscar conhecimento. A estrutura do pensamento em si é dialética, e é do próprio pensar buscar contradição o tempo todo. Na sua obra “Dialética do Esclarecimento”, Adorno aborda a fala da nova direita alemã emergente e do ódio desta aos intelectuais. Por não possuir espírito humano crítico ela se revoltou contra quem o possuía, e queimou os seus livros.
Adorno está falando do nosso tempo? Não, mas poderia. A direita tosca que ora está no poder é contra pesquisa e intelectuais. Seus correligionários são anti-ciência, mas não passam de gente ressentida. Se por um lado odeiam intelectuais, por outro fraudam informações em seus currículos acadêmicos, atribuindo títulos que não possuem. Intimamente, é o que desejariam ser, desejariam ter. A ignorância trouxe o ódio. Cercearam a pesquisa nas universidades, aderiram às fake news, ao movimento antivacinas e outras formas de irracionalidades. O Brasil está em trevas.
Cientista Social
Mestre em Sociologia
Professora de Jornalismo e de Publicidade e Propaganda na Uninter
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