***Vol. 1, Nº 004 / 2020 - 01/12 (FRATERNIDADE) *Cultura Lidia Domingues

Nós, E Elas

Lidia Domingues

Fiquei empolgadíssima para falar sobre fraternidade/sororidade. Pontuaria lutas, opressões e sofrimentos, mas exaltaria conquistas e alegrias. Meu problema foi, ao dar tempo nesses pensamentos, vasculhar o Twitter. Lá, me deparei com um post entusiasmado (eufórico até) sobre a conquista de Kamala Harris – merecidíssima! –, como primeira mulher negra vice-presidente do USA. Era um post da jornalista Miriam Leitão (li no retweet de uma jornalista que sigo). Parei tudo muito indignada, nem quis entender o antigo “complexo de vira-lata”, e preferi lhe conferir o selo de colonizada (este, roubei da minha amiga Rita Von Hunty).

Pensei em nossas mulheres, na política brasileira, tão incríveis quanto Kamala: temos Benedita da Silva e Marina Silva. Sugiro conhecerem a Carol Dartora, e lembrarem sempre de Marielle Franco. Temos, também, Maria do Rosário, Manuela D’ávila, minha deusa Luiza Erundina, e a brilhante Presidenta Dilma Roussef, achincalhada e rechaçada justamente por ser mulher. Defendi algumas vezes Miriam dos desaforos da minha tia, enquanto essa assistia o jornal da manhã e falava, indignada e insistente todos os dias: “que cabelo feio!”, “olha a pele dessa mulher, será que não tem dinheiro pra um dermatologista?” ou “que voz esganiçada”. Prontamente eu mostrava a sua inteligência e eloquência (mesmo não concordando com tudo o que era exposto por ela), porque defender outra mulher já fazia parte do meu propósito na vida – mesmo que intuitivamente, pois ainda nem conhecia a palavra sororidade.

Agora que conheço não só a palavra, mas o seu significado, entendo que ainda estamos divididas. Miriam Leitão se tornou “efetiva” no grupo da minha tia e une, em sua irmandade, um grande número de jornalistas da Globo News (tem uma senhora de Brasília que torna meu ranço incontrolável, e ela AINDA defende os assassinos de Galdino!). Elas se apoiam, compactuam dos mesmos sentimentos e pensamentos – assim como eu e meu grupo – mas, estamos em lados opostos e deveremos, infelizmente, continuar assim por mais um tempo.

Lidia Domingues

Letróloga
Especialista no Ensino da Literatura Brasileira Contemporânea
Autora do Livro de Contos “Lascas Lascadas”
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