Foi divulgada recentemente uma gravação atribuída a um pastor do Ceará, sobre os candidatos nas eleições municipais de 2020, na qual falou que “o crente que vê o cara se comprometer com a viadagem [“causa gay”], creio que não vá votar em um homem desse […]. Nós temos que passar esse vídeo para os crentes, para que eles não votem nessa carniça”. Há quem, inclusive na atual gestão de uma instituição pública – a Advocacia Geral da União –, considera que tal posicionamento público se trataria apenas de liberdade de expressão religiosa.
Segundo decisão de 2003, do Supremo Tribunal Federal sobre um caso de racismo (lembrando que LGBTIfobia também se configura como discriminação), a liberdade de expressão só é válida até o ponto em que não fira a dignidade humana alheia – não sendo, portanto, irrestrita. Citando o ministro Gilmar Mendes: “não se pode atribuir primazia absoluta à liberdade de expressão, no contexto de uma sociedade pluralista, em face de valores outros como os da igualdade e da dignidade humana”. Os preceitos da liberdade de expressão (e da igualdade perante a lei) devem ser complementares, e não ser vistos como antagônicos – pois foram, ambos igualmente, incorporados até mesmo na Declaração Universal de Direitos Humanos e, por conseguinte, na Constituição Federal brasileira de 1988.
O espírito do cristianismo é o amor incondicional ao próximo, basta ler algumas parábolas bíblicas, como a de Mateus 21. Já passou da hora de sair da Idade das Trevas; pois, tanto do ponto de vista constitucional quanto dentro de uma perspectiva verdadeiramente cristã, utilizar-se de interpretações machistas, racistas e LGBTIfóbicas da Bíblia – como pretexto para discriminar mulheres, “minorias” raciais e pessoas LGBTI+ –, para semear discursos de ódio, é uma prática traiçoeira e, segundo a jurisprudência brasileira, é um crime inafiançável e imprescritível. Constitucionalmente, há espaço para todas as pessoas em pé de igualdade, sem sobrar lugar para quaisquer discursos de ódio.
Pedagogo, Letrólogo
Doutor em Educação (com pós-doutorado na mesma área)
Diretor da Aliança Nacional LGBTI+
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